A Ponte dos Espiões, análise e curiosidades
Menos espectacular, que em tempos, o veterano Steven Spielberg regressa agora com esta história baseada na realidade, sobre a troca de espiões entre os EUA e a URSS, nos anos 50, no inicio da Guerra Fria e nos primeiros dias da construção da Cortina de Ferro. Trata-se de um drama sóbrio e bem construído, sobre um momento crucial da história contemporânea.
FICHA TÉCNICA |
Título Original: Bridge of Spies Realizador: Steven Spielberg Elenco: Tom Hanks, Mark Rylance, Scott Shepherd, Amy Ryan, Sebastian Koch, Alan Alda Género: Drama NOS | 2015 | 121 min[starreviewmulti id=18 tpl=20 style=’oxygen_gif’ average_stars=’oxygen_gif’] |
O novo filme de Steven Spielberg senão é globalmente uma história verídica, pois tem muito de ficção, enquadra pelo menos muito do que aconteceu, num drama de espionagem com contornos diplomáticos e com todas as personagens que existiram na realidade.
Em 1986, pouco antes da Queda do Muro (1989), já com a Guerra Fria a ‘arrefecer’, o agente soviético Refusenik Natan Sharansky foi libertado através de uma troca realizada na Ponte Glienicke em Berlim. Curiosamente no centro das negociações estava um tal James B. Donovan, um veterano advogado de Brooklin protagonizado no filme por Tom Hanks.
No entanto este episódio da história mais recente não faz parte do filme, pois A Ponte dos Espiões, decorre antes na década de 50, quando o mesmo Donovan tinha actuado como negociador, para além de ter defendido em tribunal, um convicto e carismático espião soviético: o Coronel Vilyam Fisher, conhecido como Rudolf Abel, um agente da KGB, nascido na Inglaterra, e que escapou às purgas de Estaline e da sua policia política NKVD.
‘Um filme dedicado aos admiradores da obra de Spielberg e para os amantes ‘soft’, das histórias de espionagem.’
‘A Ponte dos Espiões’, centra-se pois na história do interesse dos russos pelo regresso de Abel, e dos EUA, que querem de volta são e salvo Francis Gary Powers (Austin Stowell), um jovem e desastrado piloto do avião U-2, abatido numa missão de espionagem, em pleno território soviético. E quem melhor para estabelecer estas negociações que o advogado Donovan (novato pelo menos em questões de diplomacia e espionagem), que se vê assim envolvido nas complexas tramas da política internacional, nos dias que antecedem precisamente à construção do Muro, que dividiu a cidade de Berlim e a Alemanha.
Donovan que na realidade já tinha feito parte da equipa de juristas associados ao Processo de Nuremberga, logo após o final da II Guerra Mundial, é um advogado rigoroso e que não hesita, contra tudo e todos, defender o espião Rudolf Abel (Mark Rylance) e até salvá-lo de uma sentença de morte. É o seu corajoso desempenho como advogado, que faz com que seja convidado secretamente pela CIA, para encetar negociações na troca de dois efectivos entre a URSS e EUA, através de um simples contacto, que vai chegar às altas esferas do KGB e Stasi .
Embora o filme de Spielberg, tenha muito pouco em comum com as clássicas histórias de espionagem (até ‘Munique’ tinha muito mais adrenalina!), como por exemplo ’O Espião que Veio do Frio’, de Martin Ritt (1965), a partir de John Le Carré, este ‘A Ponte dos Espiões’, é notável logo na forma como descreve os respectivos serviços de inteligência, e como apresenta imagens que nos transmitem uma sensação opressiva de uma Berlim Leste do pós-guerra, desolada, e rapidamente a fechar-se ao mundo ocidental.
‘…apresenta imagens e que nos transmitem uma sensação opressiva de uma Berlim Leste do pós-guerra…’
Todos estes elementos estão bem presentes no filme e no excelente argumento escrito por Matt Charman, e pela dupla Joel e Ethan Cohen, (‘Indomável’, de 2010, produzido curiosamente por Spielberg). Quanto aos personagens Donovan, (Hanks) representa mais uma vez o tipo de homem comum, que acaba por fazer algo de excepcional, que é na verdade a grande especialidade do actor, e aquilo que tem feitio na maioria dos seus filmes. Se por um lado Hanks, que é indiscutivelmente um grande actor, cria logo uma instantânea credibilidade e um certo nível de conforto ao vestir a pele do personagem, mas é quase sempre e apesar da coragem demonstrada pelo personagem, tem um desempenho muito previsível e até às vezes um pouco ingénuo, para as situações criadas na gelada Berlim
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Pelo contrário, o aparentemente inofensivo Rudolf Abel (Mark Rylance) torna-se numa grande figura, sustentada por uma interpretação surpreendente que aos poucos e estranhamente consegue ser hipnotizante e envolvente. Ao ponto de tanto a personagem de Hanks, como o espectador, acabarem com facilidade por simpatizar com a figura do espião e um traidor em simultâneo à causa russa e norte-americana. Abel tem um carácter extraordinário (um espião que se esconde sob a capa de um sereno, solitário e melancólico pintor de paisagens, para quem não adianta preocupar-se com a sua situação); e depois fruto igualmente de uma espantosa interpretação do actor, ao nível da minúcia do olhar, dos gestos e tiques, que ligam na perfeição com a personalidade excêntrica de Rodolph Abel, um espião perfeito, que apesar de tudo acaba descoberto e se vai tornar objecto de troca. No quadro dos actores, o destaque vai também para a interpretação Sebastian Koch como Vogel, que faz quase como sempre um bom papel de vilão de Leste, mas que acaba por ter tem poucas cenas no filme.
‘…Rudolf Abel (Mark Rylance) tem uma interpretação surpreendente que consegue ser hipnotizante e envolvente.‘
Vale a pena destacar ainda a equipa de design de produção (cenários e guarda-roupa), dirigida por Adam Stockhausen, que parece interpretar muito bem o argumento e recriar de uma forma viva e rigorosa, as pessoas, as ruas enlameadas e cheias de escombros, os prédios bombardeados, o início da construção do muro e das redes de arame-farpado com vigias armados, dando a ideia de grande realismo. Consciente de um enorme simbolismo necessário para apoiar os ambientes sombrios, criados pela excelente fotografia de Janusz Kaminski, (que trabalha habitualmente com Spielberg) o compositor Thomas Newman, (que substitui o eterno John Williams), assina uma excelente banda sonora, carregada de sentimentalismo sinfónico e expressivo.
‘A Ponte dos Espiões’, está muito longe da espectacularidade da maioria dos filmes de Steven Spielberg, pois é um filme sóbrio, um trabalho de realização tranquilo, narrativo e histórico, feito já por um veterano (o tempo passa para todos!), que tem ainda um grande instinto e capacidade para criar fortes impactos emocionais no espectador. Um filme dedicado os admiradores e que têm acompanhado a obra de Spielberg e para os amantes ‘soft’, das histórias de espionagem.
CURIOSIDADES
Merkel nas filmagens: A chanceler alemã Angela Merkel visitou a ponte Glienicker, em Berlim, onde Steven Spielberg rodava o filme. Merkel foi recebida por Tom Hanks com o braço em riste, imitando os agentes que durante décadas controlaram dia e noite a fronteira.
Spielberg & Irmãos Coen: Esta é a segunda colaboração entre Steven Spielberg e os irmãos Coen, Ethan e Joel. Spielberg foi produtor executivo de ‘Indomável’ (2010), cuja realização é dos Coen. Agora a dupla de realizadores é co-argumentista deste filme.
Spielberg & Hanks: Esta é a quarta colaboração cinematográfica de Tom Hanks com Steven Spielberg. Eles já trabalharam juntos em ‘O Resgate do Soldado Ryan’ (1998), ‘Apanha-me Se Puderes’ (2002) e ‘Terminal’ (2004). Essa é a primeira parceria em mais de dez anos.
EUA vs URSS: O pai de Steven Spielberg, Arnold Spielberg, trabalhou como engenheiro num programa especial de intercâmbio na Rússia, durante a Guerra Fria, logo após Francis Gary Powers ser abatido e quando houve um tremendo receio e hostilidade entre as duas nações. Spielberg lembra-se de ter visto os cidadãos russos formarem fila só para observarem Powers e dizerem: ‘vejam o que a América nos fez’. Quando perceberam os engenheiros americanos estava lá, os russos apontaram para eles e disseram: ‘Olhem o que o vosso país está a fazer connosco’, manifestando de alguma o medo e a raiva que um país sentia pelo outro.
Newman substitui Williams: Este é o primeiro filme de Steven Spielberg, desde ‘A Cor Púrpura’ (1985), cuja trilha sonora não é composta por John Williams. Em março de 2015, após os compromissos de Williams terem sido interrompidos devido a um problema de saúde, que supostamente já está resolvido, Thomas Newman substituiu-o como compositor da banda sonora original.
Consulta Também: Guia das Estreias de Cinema | Dezembro 2015
JVM
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