Bacurau | 72º Festival de Cannes

72º Festival de Cannes | ‘Bacurau’, o Brasil Tal Como É…

‘Bacurau’, da dupla Kleber Mendonça Filho (‘Aquarius’) e Juliano Dornelles, é para já o filme-sensação desta competição do 72º Festival de Cannes. Amado por uns, um certo desapontamento para outros, é efectivamente um metafórico retrato do Brasil da actualidade.

Bacurau é uma aldeia ficcional perdida no fim-do-mundo, na imensidão do sertão brasileiro igual a muitas outras do interior do Brasil. A sua localização torna-se o ponto de partida do mistério que está por detrás do filme Bacurau, da dupla Kleber Mendonça Filho (‘Aquarius’) e Juliano Dornelles: o nome da aldeia estranhamente desapareceu do google maps do país.

TRAILER DE ‘BACURAU’

Os habitantes de Bacurau, abandonados pelo Estado, com escassez de água, alimentos e medicamentos, formam uma comunidade forte, apesar de díspar, resistindo alguma forma no seu silêncio, à pobreza, às doenças, à brutalização do mundo moderno, à ganância dos políticos que são corrompidos pelos americanos. É nesta atmosfera distópica, (com bandidos bons e milícias de mercenários norte-americanos), ao mesmo tempo realística e mística de raízes africanas (as drogas alucinogénicas, à capoeira como dança da guerra), que Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles (diretor artístico que o acompanhou em vários projectos anteriores), desenvolveram uma fábula de antecipação ultra-violenta — as influências de Sam Peckimpah e Quentin Tarantino, são inevitáveis — ‘meio-western’, com muita acção e suspense, que nos fornece um hiper-retrato social e colorido (nos tons da casas, do céu, da vegetação, das ruas e pessoas da aldeia), ainda que algo negro de um país que parece estar efectivamente em decomposição.

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Bacurau
Bárbara Colén é Teresa e está de regresso às origens.

Até com reacções da natureza, como mais um grande deslizamento de terra no Morro do Vidigal, ontem no Rio de Janeiro. Depois da descoberta de ‘O Som ao Redor’ (2012), filmado no Recife, a sua cidade natal, a carreira do ex-crítico de cinema e realizador de curtas-metragens, Kleber Mendonça Filho, nunca mais parou. Inclusive esteve na competição do Festival de Cannes 2016 com ‘Aquarius’, a sua segunda longa-metragem, protagonizada por Sónia Braga, que aliás regressa no influente papel da Dra. Domingas, médica da aldeia, em ‘Bacurau’, mas num filme agora com personagens corais e um elenco internacional (os brasileiros Bárbara Colen, Thomas Aquino, Silvero Pereira e o veterano alemão Udo Kier, além de um grupo de actores americanos de segunda linha). Ao contrário de 2016 ter aproveitado a passadeira vermelha para alertar o mundo sobre o que estava acontecendo no Brasil, com o ‘golpe’ contra a então presidente Dilma Rousseff, desta vez os dois realizadores, parecem ter deixado o filme falar por si e de uma forma metafórica sobre a actual situação do Brasil.

Bacurau
Os habitantes lutam no seu silêncio contra a falta de água.

‘Bacarau’, estreia na Croisette (e há vários filmes brasileiros espalhados pelas diversas secções) após a eleição democrática do Presidente da extrema-direita, Jair Bolsonaro numa atmosfera muito tensa, enquanto a cultura e a educação parecem estar ameaçadas, pelo novo governo: ‘Estou muito feliz mas ao mesmo tempo um pouco triste, porque esta segunda seleção em Cannes chega num momento muito estranho para o nosso cinema, que estava em ascensão, e agora está passando por uma grave crise, tem realçado o realizador e voltou a dizê-lo hoje na conferência de imprensa. Se júri presidido por Alejandro González Iñárritu, vindo do continente sul-americano não o deixar passar ao lado e seguir a mesma linha de Cate Blanchett no ano passado de distinguir e dar visibilidade aos filmes que exploram os estados do mundo, é bem provável que ‘Bucarau’, esteja na lista dos premiados.

José Vieira Mendes



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