76º Festival de Venezia | The Laundromat olha os Panamá Papers
Em ‘The Laundromat’, o cineasta norte-americano Steven Soderbergh conta de uma forma muito irónica o escândalo dos Panamá Papers, num filme com Meryl Streep, Gary OldMan e Antonio Banderas
Afinal Steven Soderbergh não passou à reforma e regressou em grande estilo ao Lido de Veneza com ‘The Laundromat’, um importante filme sobre os Panamá Papers, um escândalo sem precedentes, que incendiou o mundo financeiro e a opinião pública internacional em 2016. Os segredos obscuros dos movimentos financeiros, negócios escuros, fuga de impostos e de capitais para os chamados ‘paraísos fiscais’, realizados pela alta finança, são tranquilamente revelados, por dois dos principais protagonistas: Jürgen Mossack (Gary Oldman) e Ramón Fonseca (António Banderas).
Dez anos depois de ‘O Informador’, Steven Soderberg parece ser o cineasta ideal para revelar ao mundo através dos filmes — mais um na competição da Netflix — numa louca e desembaraçada trama que tem uma lógica de intriga internacional, esses segredos e a corrupção exposta nas linhas dos documentos dos Panamá Papers. A ver também o documentário homónimo, estreado recentemente, realizado por Alex Winter.
VÊ TRAILER DE ‘THE LAUNDROMAT’
‘The Laundromat’ é baseado numa história verdadeira e, publicada no livro: ‘Secrecy World: Inside the Panama Papers Investigation of Illicit Money Networks and Global Elite’, da autoria do jornalista de investigação Jake Bernstein, nomeado com um Pulitzer. No filme Meryl Streep é Ellen Martin, uma aguerrida viúva que procura descobrir o que está escondido atrás da apólice de seguro de vida do marido (James Cromwell) – falecido num acidente – que perdeu a sua garantia e direito a indemnização por causa de uma suposta fusão de seguradoras. Entre operações suspeitas, empresas fictícias e contas no exterior, surgirá o nome do escritório de advogados Mossack & Fonseca, ou uma encarnação sofisticada do gato escondido com o rabo-de-fora, sediado no Panamá e especializado na ocultação de fortunas pertencente a grandes nababos. Após um emaranhado de ligações espalhadas à escala intercontinental — a história desenvolve-se entre os EUA, China, México, África e Caraíbas — é revelado um sofisticado sistema de corrupção, evasão fiscal e lavagem de dinheiro. O caso foi amplamente divulgado à opinião pública em 2016 por uma impressionante reportagem realizada por cerca de 400 repórteres, reunidos no Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, que analisou cerca de 11,5 milhões de documentos confidenciais pertencentes à sociedade de advogados Mossack & Fonseca.
Os Panamá Papers, revelaram as atividades ilegais de políticos, empresários e celebridades. Contudo, por mais sensacionais e ilícitas que tenham sido estas revelações, foram rapidamente esquecidas e o dinheiro continua a fazer girar o mundo. No entanto, Soderbergh decidiu refrescar-nos a memória com um filme com um discurso bastante original e sarcástico — como se os dois advogados fossem os compères, de uma ópera-bufa, que nos revolta e nos faz rir à boca fechada. Meryl Streep, conseguiu como sempre com a sua competência e elegância não roubar protagonismo a outros colegas famosos como os já referidos: Gary Oldman e Antonio Banderas; mas também às notáveis participações de Jeffrey Wright, Matthias Schoenarts, James Cromwell e Sharon Stone, esta numa pequena e saudosa aparição.
O francês Olivier Assayas (‘Vidas Duplas’) regressou igualmente ao passado recente, aos anos 90, com ‘Wasp Network’, uma história de espionagem entre Cuba e os EUA, baseada igualmente em factos reais e reconstruídos no livro ‘O Último Soldado da Guerra Fria’, do brasileiro Fernando Morais. ‘Wasp Network’ conta a história de cinco cubanos — Gerardo Hernández, Antonio Guerrero, Ramon Labañino, Fernando González e René González — agentes secretos, infiltrados por Cuba, nas organizações anti-Castro em Miami e, que foram presos pelo FBI em setembro de 1998 acusados de espionagem e outras atividades ilegais nos EUA. As complexidades da política internacional e das relações EUA-Cuba, da informação, contra-informação e propaganda — no fundo as fake news — que sempre existiram, são tratadas pelo cineasta francês de uma forma ligeira e superficial. É pena pois o assunto dava pano para mangas. Vale no entanto o grande elenco de serviço, num filme que tem um registo quase de série B. Ao lado de Gael García Bernal está Édgar Ramírez (já trabalhou com Assayas na minissérie ‘Carlos’) e uma excelente Penélope Cruz, que fica maravilhosa a fazer o sotaque cubano; e ainda Leonardo Sbaraglia (de ‘Dor e Glória’, de Almodóvar ), o brasileiro Wagner Moura e a bela Ana de Armas, (cubana por nascimento, a iniciar uma carreira em Hollywood) que vai ser uma das próximas bond girls.
JVM em Veneza