Fernanda Torres em (Ainda Estou Aqui) © Big Pictures

Ainda Estou Aqui: Quando o Brasil se revê no seu cinema!

O filme brasileiro “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles é a longa-metragem sensação da temporada. Fernanda Torres, a protagonista foi a vencedora do prémio de Melhor Atriz de Drama e o filme concorreu na categoria de Melhor Filme Internacional dos Golden Globes 2025. A concorrência é forte mas tanto a atriz como o filme podem estar entre as cinco finalistas na corrida aos Óscares 2025 que vão ser anunciados dia 23. O filme estreia esta semana em Portugal e espera-se uma boa frequência nas salas de cinema aliás como aconteceu no Brasil.

“Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles (“Terra Estrangeira”, “Central do Brasil” ou “Diários de Che Guevara”) não foi certamente pensado apenas para concorrer aos principais prémios da indústria de cinema, nem para agradar aos programadores e jurados dos festivais internacionais, embora o cineasta e os seus filmes tenham tido uma presença regular, nestes espaços de promoção da crítica. Aliás Walter Salles é apesar de tudo uma figura e um cineasta bastante influente.

O filme rapidamente conquistou reconhecimento em festivais internacionais, com uma longa lista de prémios ganhos, reforçando as suas possibilidades de ser nomeado para os Óscares 2025 e até sair vencedor, apesar da forte concorrência; incluindo ao nível das interpretações, que competem com Fernanda Torres: a vencedora do prémio de Melhor Atriz de Drama dos Golden Globes 2025 e em boa parte a grande responsável pela empatia que o filme transmite.

O percurso de sucesso “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles começou naturalmente com o Prémio de Melhor Argumento no Festival de Veneza 2024 — talvez tivesse merecido mais, a ver pelo palmarés resultante — e teve cerca de 14 minutos de aplausos na sessão oficial, realizada na Sala Grande do Pallazo der Cinema, em setembro passado no Lido.

Os aplausos valem o que valem, porém, o sucesso do filme não se tem refletido apenas nisso e nos prémios ou nas nomeações, “Ainda Estou Aqui” está a ser um tremendo êxito de público no Brasil, — deixou para trás “Wicked” e “Gladiador 2” — onde já foi visto por mais de três milhões de pessoas, ultrapassando mesmo o sucesso de “Central do Brasil” (1998), outros dos grandes filmes do realizador, protagonizado pela lendária e ainda viva Fernanda Montenegro, mãe de Fernanda Torres.

“Ainda Estou Aqui” entrou inclusivamente no top dos cinco filmes mais vistos no país durante este século e depois da pandemia, pese embora a rejeição de organizações bolsonaristas e ligadas à extrema-direita. Em “Ainda Estou Aqui” é quase uma nação inteira que se revê no cinema nacional e numa história real que tem a ver com uma realidade histórica muito dolorosa ainda para uma boa parte dos brasileiros! Contudo, qual é o segredo para fazer um filme que agrada, aos espectadores (nacionais e internacionais) e não é feito apenas a pensar nos festivais ou nos Óscares?

Ainda Estou Aqui
A história dramática da família Paiva chega ao cinema. © Big Picture Films

Um que se país revê no seu cinema

Estava no Rio de Janeiro quando filme estreou nas salas de cinema. Nos programas de televisão, nas conversas de café ou entre amigos, nos corredores dos shoppings — brasileiro adora shopping — ou nas redes sociais “Ainda Estou Aqui” era o tema não só dos cariocas, mas do Brasil inteiro. Três semanas depois da estreia ainda havia muita gente que ainda não o tinha visto, mas que comentava o seu impacto na sociedade brasileira.

Porém, além da unanimidade da crítica nacional — até de algumas ‘intrigas’ lançadas pela imprensa brasileira, de que a presidente do júri em Veneza, Isabelle Huppert, teria secundarizado o filme — as conversas em geral, eram marcadas por grandes aplausos e muita emoção, fora e dentro das salas de cinema, mesmo para os espectadores que não vão ver muito ver o cinema nacional, mas que pelo imediatismo do filme, acabam sendo arrastados.

Além disso, “Ainda Estou Aqui” revela um período político crítico da História que se mantêm muito atual e oportuno. E isso também convida a ir ao cinema e a reflectir sobre como essa história aconteceu e para que não volte a acontecer.

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“Ainda Estou Aqui” parte de uma adaptação do livro homónimo escrito por Marcelo Rubens Paiva, mais conhecido por outra das suas grandes obras “Feliz Ano Velho”, um relato autobiográfico do autor, que relata o acidente que o deixou tetraplégico — um grande sucesso de vendas nos anos 1980.

A história de “Ainda Estou Aqui” passa-se na década de 1970, no período mais intenso da ditadura militar no Brasil, e acompanha a trajetória da família Paiva, composta por Rubens (interpretado por Selton Mello), Eunice (vivida por Fernanda Torres) e seus filhos.

A vida da família transforma-se completamente quando, em um dia fatídico, Rubens Paiva é levado por militares à paisana e desaparece sem deixar rasto. Eunice, que dedicará décadas em busca de respostas sobre o paradeiro do marido, precisa se reconstruir e traçar um novo caminho para si e para seus filhos.

Ainda Estou Aqui
No início uma família amorosa e feliz. © Big Picture Films

Um elenco notável e reconhecido

O elenco puxa também para ver o filme já que é composto por duas estrelas muito populares no Brasil, (Torres e Selton) e conta ainda com um grupo notável de atores do cinema e da televisão brasileira: Valentina Herszage (“Elas por Elas”), Maeve Jinkings (“Pedágio”), Antonio Saboia (“Deserto Particular”), Olívia Torres (“Continente”), Humberto Carrão (“Aquarius”), Dan Stulbach (“Mulheres Apaixonadas”), Charles Fricks (“Terra e Paixão”), Caio Horowicz (“Boca a Boca”), Daniel Dantas (“Pega Pega”).

Coincidentemente “Ainda Estou Aqui” estreou também num momento em que foram revelados planos de um golpe, para impedir a posse do Presidente Lula da Silva em 2023 e em que a amnistia aos golpistas do Oito de Janeiro estava na agenda do Congresso: ‘Sem amnistia para os golpistas’ gritaram alguns dos espectadores sobretudo os que assistiram às primeiras sessões do filme, durante os créditos finais — e ao som de “É preciso dar um jeito, meu amigo”, com a voz de Erasmo Carlos, completando as manifestações, com fortes aplausos.

Muitos espectadores diziam que saiam com um ‘nó na garganta’, por causa do desenrolar do drama dessa família e não era raro ver as pessoas sairem da sala de uma forma lenta e muito comovida e chocada. O facto é que o Brasil vive uma situação de preocupação com a sua democracia e ainda pode um dia passar por algo semelhante ao que é mostrado no filme.

“Ainda Estou Aqui” trás-nos mesmo a nós portugueses, que também passamos por uma ditadura fascista, uma sensação que mistura angústia com as memórias da nossa história colectiva, que terminou há 50 anos com o 25 de Abril.

Porém, é de facto notável ver como o público brasileiro tem enchido as salas de cinema, para uma experiência colectiva e para ver um filme nacional. Na verdade, para se olhar ao espelho, para conhecer a história da família de Eunice (Fernanda Torres) e Rubens (Selton Mello), e vivenciar uma parte da história relativamente recente do Brasil. Os espectadores parecem ter percebido que as emoções que o filme suscita ficam mais fortes quando vividas em conjunto.


Uma paixão nacional (e internacional)

Além do enorme sucesso entre o espectador comum, também os artistas e famosos brasileiros e não só, têm elogiado “Ainda Estou Aqui”, sobretudo nas redes sociais. Caetano Veloso diz sobre um terno momento do filme que riu quando o pai tira o dente de leite da filha mais nova da areia da praia do Leblon e ‘depois quase não parei de chorar. Vi e vivi os tempos do começo do anos de 1970 como se voltasse lá’.

Num post do Instagram, Selton Mello falou de uma conversa que teve com a estrela norte-americana Sean Penn a propósito de “Ainda Estou Aqui”: ‘Emocionou-me imenso, carregarei comigo este filme para sempre. O dia em que eu parar de me sensibilizar com manifestações como esta, significa que sequei por dentro’.

Mas o êxito de “Ainda Estou Aqui” tem ultrapassado o cinema e foca-se também na literatura. O livro de Marcelo Rubens Paiva, com a estreia do filme, saltou pra os top de vendas  em todo o país. A psicóloga Vera Paiva (interpretada por Valentina Herszage), filha mais velha de Eunice e Rubens, tem um programa na TV Globo, chamado “Altas Horas”, nele contou que a interpretação de Fernanda Torres é tão convincente, que ficou com vontade de lhe chamar ‘mamãe’; disse também que se sentiu muito bem retratada no filme e elogiou a produção por ter encontrado uma casa muito parecida com a da sua infância, que foi entretanto demolida, em pleno bairro do Leblon.

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De Hollywood também chegam boas perspectivas para os Oscar a começar pela imprensa especializada (Hollywood Report, Variety) e associações de críticos internacionais, que na sua maioria já viu o filme ao contrário dos academistas das Artes e Ciências Cinematográficas, que ou os vêm através de link, nas sessões especiais já que os prazos de votação terminaram esta semana dia 14 de janeiro.

Ainda Estou Aqui
Fernanda Torres interpreta uma verdadeira mãe-coragem. © Big Picture Films

Torres uma verdadeira mãe-coragem

De qualquer maneira, “Ainda Estou Aqui” já fez história porque pela primeira vez em 16 anos, uma produção brasileira entrou na shortlist de Melhor Longa Internacional, na corrida aos Óscares. A lista foi anunciada a 17 de dezembro pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood e figurou como um dos 15 filmes pré-selecionados para a categoria, e continua a ser sem dúvida uma das fortes apostas nesta categoria.

Entretanto a mesma Academia informou que o anúncio dos nomeados aos Oscar 2025, que estava marcado para o dia 17 de janeiro, foi adiado agora para o dia 23, devido aos graves incêndios que deflagraram na cidade de Los Angeles (EUA). Razão pela qual, o período de votação para os nomeados foi ampliado para 14 de janeiro, dois dias antes da estreia em Portugal.

Desde que foi cogitada a possibilidade de Fernanda Torres vir a ser nomeada ao Oscar de Melhor Actriz e depois da surpresa como vencedora do prémio de Melhor Atriz de Drama, nos Golden Globes 2025, o público brasileiro começou a mobilizar-se nas redes sociais para demonstrar o seu apoio à atriz e ao filme “Ainda Estou Aqui”.

Entretanto a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas também publicou no seu no Instagram, uma fotografia de Fernanda Torres no evento Governors Awards, onde escreveu ‘Ela é mãe’, ao lado do registo da atriz, algo que gerou uma enxurrada de comentários de fãs brasileiros.

Em menos de 24 horas, o post com superou os 200 mil comentários, um número muito acima da média de outras publicações de outras estrelas. Esta mobilização reflete de certo modo a força do público brasileiro, que torce para que tanto Fernanda como o filme cheguem aos Oscar, já que “Ainda Estou Aqui”, aborda um período marcante da história do Brasil, reforçando ainda a relevância da história no contexto internacional.

Já tiveste a oportunidade de ver “Ainda Estou Aqui”?



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