Bros — Uma História de Amor, em análise
“Bros — Uma História de Amor” chegou às salas de cinema portuguesas no dia 24 de novembro de 2022. É a primeira grande comédia romântica de estúdio protagonizada por um casal homossexual. Este filme da Universal Pictures, tão relevante para a história do mainstream, conta em Portugal com distribuição Cinemundo.
A Universal Pictures apresenta-nos a primeira grande comédia romântica de estúdio protagonizada por um casal de homens.
Parece inacreditável que só agora tenhamos chegado a este ponto, em 2022, embora tenhamos tido exemplos muito bem-sucedidos de histórias que não exploram o trauma gay no passado recente, como por exemplo a narrativa juvenil “Love, Simon”, que se expandiu para a série “Love, Victor”, a comédia natalícia lésbica “Happiest Season”, ou ainda séries como “Schitt’s Creek” (tão mencionada em “Bros”, com alguma crítica à mistura mas sem dúvida com uma nota de admiração) ou recentemente o fenómeno adolescente de “Heartstopper“.
Todavia, a paisagem de histórias LGBTQI+ positivas e ‘mundanas’ continua a ser bastante reduzida, sendo os retratos da comunidade acima de tudo representados por “atores heterossexuais a desempenharem cowboys gays” (como “Bros — Uma História de Amor”, aliás, satiriza de forma tão eficaz, deixando uma crítica intencionalmente pouco subtil a “Power of the Dog” pelo caminho).
Para além de ser uma comédia romântica, repleta de clichés de género, da evolução da narrativa à banda-sonora, “Bros — Uma História de Amor” é também uma obra incrivelmente auto-consciente no que diz respeito à crítica da representação LGBT nos meios ditos ‘mainstream’. Mais feroz e de louvar é, contudo, o reforço que o filme faz do apagamento de histórias de amor queer ao longo de toda a História com “H” grande.
Billy Eichner, que conhecemos como a pessoa que berra com estranhos na rua no canal de Youtube “Billy On The Street”, é aqui o protagonista da obra e, como co-argumentista e também produtor executivo, sentimos que as suas opiniões e crenças pessoas jorram através da personagem Bobby.
Algo muito importante que nos ensina é que nem todas as histórias de amor são iguais, e que histórias de amor queer não serão necessariamente iguais a histórias de amor entre pessoas cis e hetero (e não há problema!).
Bobby (Eichner) diz-nos, ou grita-nos, como é a sua marca, uma e outra vez, que “love is love is love” não é necessariamente o melhor slogan para a ‘causa’ queer – uma vez que moldar relações LGBT a ideais heteronormativos não será a melhor forma de promover a sua auto-aceitação.
Para lá da tag line, “Bros – Uma História de Amor como qualquer outra. Ou Talvez não“, a própria narrativa realça os problemas muito específicos da relação que se desenvolve entre Bobby (Eichner) e o novo amor da sua vida, Aaron (o bem-parecido Luke Macfarlane).
A indisponibilidade emocional tanto de Bobby como de Aaron é inicialmente o principal obstáculo em “Bros — Uma História de Amor” e uma vez que a história evolui, o obstáculo (acima de tudo internos e não externos, recalibrando o padrão da representação queer) passa a ser a diferente forma como as duas personagens centrais lidaram com o trauma: expansão e “ser loud” / audível (Bobby) ou repressão e tentativa de adoção de comportamentos mais heteronormativos ou “passing” (Aaron).
O grande ponto a favor é que tudo em “Bros” nos parece bastante bem pensando e realista (isto no que diz respeito à estrutura do argumento e diálogos). Escrever uma comédia romântica é muito mais difícil do que possamos pensar, pois enquanto géneros como o drama, fantasia, sci-fi, geram em torno da surpresa, choque, inovação, a rom-com gira em torno de lugares comuns confortáveis.
“Bros — Uma História de Amor” não tenta, de forma alguma, escapar a esses mesmos clichés. Aliás, está pejado deles, não fosse esta uma longa realizada e co-escrita por Nicholas Stoller (argumentista de “Sex Tape”, “Five-Year Engagement”, e que se estreou na realização com o hilariante e maravilhosamente tosco “Forgetting Sarah Marshall”, em portugês traduzido para um dos piores títulos de sempre – “Um Belo Par… de Patins”) e produzida pela máquina do maior produtor e realizador norte-americano de comédia no mainstream – Judd Apatow (“Bridesmaids”, “Virgem aos 40″, “Girls”, “The King of Staten Island” e tantos outros projetos mundialmente reconhecidos).
Sim, “Bros” não tenta todo quebrar o molde e é incrivelmente lamechas (mas achamos que no bom sentido). É também enternecedor e extremamente engraçado. Tal como o primeiro filme de Nicholas Stoller, “Forgetting Sarah Marshall”, acaba também com um memorável número musical, e tal como esta narrativa, tenta também “esticar a corda” em relação ao que é aceitável mostrar numa comédia romântica para um público vasto, tentando incluir no processo alguma nudez (física e emocional) e situações mais íntimas.
Quando ao elenco de “Bros — Uma História de Amor”, faz-se compor por unicamente por pessoas LGBTQI+ a protagonizar tais papéis, tentando escapar da tentação que muitos estúdios mainstream têm, a de contratar pessoas cis para interpretar pessoas trans, ou atores heterossexuais para desempenhar papéis queer.
Este filme representa, sem dúvida, um avanço relevante no campo das matérias de representatividade. Engraçado, caloroso, inteligente e honesto, “Bros” brilha ainda através dos seus tais cameos – de Debra Messing (“Will&Grace”) a Amy Schumer (“Descarrilhada”, “Inside Amy Schumer”), passando por Kenan Thompson (“SNL”) ou Ben Stiller (“Noite no Museu”), entre outros.
Nos Estados Unidos, os resultados de bilheteira de “Bros” ficaram aquém do esperado, o que é realmente lamentável. Deste lado, adoraríamos visitar o museu de história LGBTQI+ edificado no filme e, quem sabe, andar na sua insana montanha-russa do trauma gay.
TRAILER | BROS — UMA HISTÓRIA DE AMOR NOS CINEMAS NACIONAIS
Bros — Uma História de Amor, em análise
Movie title: Bros — Uma História de Amor
Movie description: A Universal Pictures tem o orgulho de apresentar a primeira comédia romântica lançada por um dos grandes estúdios de Hollywood, sobre dois homens homossexuais que procuram – e eventualmente tropeçam! – no amor. Talvez. Eles estão muito ocupados…
Date published: 26 de November de 2022
Country: EUA
Duration: 115'
Author: Nicholas Stoller, Billy Eichner
Director(s): Nicholas Stoller
Actor(s): Billy Eichner, Luke Macfarlane, Monica Raymund
Genre: Comédia, Romance, Queer
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Maggie Silva - 83
CONCLUSÃO
“Bros” não é subversivo na sua abordagem à comédia romântica de Hollywood, prestando inclusive homenagem a vários clássicos dentro do género. Além disso, é uma obra produzida e realizada por grandes figuras do ‘mainstream’ e que aplica as mesmas fórmulas presentes em comédias com romances entre pessoas hetero.
Todavia, a abordagem dos traumas e especificidades das relações queer é incontestável e pretende, inequivocamente, abrir caminho para uma discussão mais lata e rica. Como benefício adicional, a longa-metragem é genuinamente engraçada e enternecedora (cumprindo assim o seu propósito como rom-com).
Pros
- As prestações centrais e a química inegável;
- A forma como as duas personagens centrais se complementam;
- Os pequenos chocolates, delicioso em todos os sentidos;
- As hilariantes discussões em torno da abertura do museu, e “aquele” momento em que Bobby leva com a bandeira.
Cons
- Billy Eichner reserva para si os melhores monólogos da obra e sentimos que a sua personagem acaba por, como consequência do seu papel como co-argumentista, merecer um maior desenvolvimento em comparação com Aaron;
- Temos também a impressão de que Bobby é um mero espelho de Billy, mas de “Girls” de Lena Dunham a “The King of Staten Island” de Pete Davidson, a verdade é que a componente auto-biográfica tem estado muitas vezes presente nas comédias produzidas por Apatow.