Conclave e Emilia Pérez: Dois filmes, duas visões sobre a comunidade LGBT+
“Emilia Pérez” e “Conclave” são dois filmes bastante diferentes. Porém, ambos abordam a temática da comunidade LGBT+, ainda que de formas totalmente distintas…
“Conclave” apresenta-nos exatamente o que designa: a eleição de um Papa, um dos eventos mais secretos do mundo. Após a morte inesperada do Pontífice, o Colégio dos Cardeais tem de se reunir para eleger o seu sucessor. E fá-lo sob a liderança do cardeal Thomas Lawrence (Ralph Fiennes), a pedido do Papa precedente.
Os quatro candidatos à posição de Santo Padre, todavia, revelam perfis muito diversos. Aldo Bellini (Stanley Tucci), dos EUA, é um liberal na linha do falecido líder da Igreja Católica; Joshua Adeyemi (Lucian Msamati), nigeriano, é um social conservador; Joseph Tremblay (John Lithgow), do Canadá, mostra-se moderado e Goffredo Tedesco, italiano, assume-se como tradicionalista convicto. O filme conta com uma pontuação de 86% no Rotten Tomatoes e está nomeado para oito Óscares.
Já “Emilia Pérez”, por outro lado, é um musical melodramático que obteve 13 nomeações para os Óscares, um número recorde. A obra acompanha, inicialmente, Rita Mora Castro (Zoë Saldaña), uma advogada mexicana altamente qualificada, mas insatisfeita com a sua carreira.
Um dia, contudo, ela recebe uma proposta de Juan “Manitas” Del Monte (Karla Sofía Gáscon). E ele, chefe de um cartel de droga, promete mudar a sua vida muda para sempre. Ora, a proposta não poderia ser mais inimaginável para Rita: “Manitas” pretende tornar-se Emilia Pérez, a mulher que sempre desejou ser. Com efeito, ao fazê-lo deixa também para trás a sua identidade criminosa, não sofrendo as consequências dos delitos que cometeu.
Conclave supera Emilia Pérez como Filme LGBT+
Um filme sobre a Igreja Católica, pelos vistos, oferece-nos um retrato mais autêntico – e melhor – da comunidade LGBT+ em comparação com “Emilia Pérez”, que a propósito se desenvolve essencialmente em torno da personagem trans de nome homónimo. E porquê?
“Conclave” enfrenta de frente, sem rodeios a relação entre sexualidade e fé. Vicent Benítez (Carlos Diehz) é a personagem que alavanca este diálogo brilhantemente realizado. Como pessoa intersexo Benítez não tem qualquer conflito interno – e muito menos vergonha – por ter nascido assim.
“Eu sou como Deus me fez”, palavras do cardeal, resumem muito bem – e, por sinal, de maneira belíssima – o nível de aceitação em que se encontra, pois a sua condição biológica não constrange a crença que tem no catolicismo. Muito pelo contrário: reforça-a.
Em oposição, “Emilia Pérez” usa – literalmente – a personagem principal trans como mero artifício narrativo, como bandeira, ou seja, para empolar a trama, mas com isso acaba somente por estereotipar as pessoas transsexuais, estereotipação essa que é fortalecida pelo facto do projeto transmitir a ideia de que os procedimentos de afirmação de género são equivalentes a procedimentos estéticos.
A conceção da transição de “Manitas” como um processo que também serve para ilibá-la dos crimes que cometeu é problemática, nomeadamente quando a obra falha imenso em mostrá-la arrependida pelas atrocidades que fez. Simplesmente ao “tornar-se” mulher fica automaticamente redimida.
“Conclave” não se centra unicamente na cultura LGBT+, no entanto, quando vai ao seu encontro é muito mais pertinente que “Emilia Pérez”, cujo foco no assunto é maior, mas, infelizmente, superficial.
Qual é para ti o filme que melhor representa a comunidade LGBT+? Conclave ou Emília Pérez?