Daqui Houve Resistência: Episódio 1, a Crítica | À força não há 25 de abril
“Daqui houve resistência” é a nova série da RTP1 para comemorar o 51.º aniversário do 25 de Abril de 1974. Uma série de 5 episódios que estreia hoje às 21h na RTP1. Desde as 12h já está disponível o 1.º episódio na RTP Play. Em exibição até 2 de maio, esta obra começa a sua narrativa em 1968 e terminará em 1974, passando por temáticas como a Guerra Colonial, as greves, os estudantes, a luta armada e as falsas eleições. O 1.º episódio é focado num protesto estudantil e nas ações militares.
Produzida pela produtora “Bando à Parte”, responsável por filmes como “Porto” (2016, Gabe Klinger) ou “Listen” (2020, Ana Rocha de Sousa), esta série baseia-se no livro “Guimarães Daqui Houve Resistência” de César Machado. Inspira-se igualmente em factos e pessoais reais retratadas no livro em causa.
Sobre “Daqui houve resistência”
Em 2024, a RTP1 apresentou a série “Sempre” que acompanhou, de forma antológica, diferentes protagonistas da Revolução de Abril em cada episódio mostrando também um pouco das suas lutas nos últimos anos do Estado Novo. Agora, em “Daqui houve resistência”, a Revolução de Abril não é o foco da narrativa mas sim os anos que lhe antecederam. A saber, segundo as sinopses disponíveis no site da RTP, esta série é também antológica com diferentes protagonistas em cada episódio. Contudo, é possível ver que no último episódio algumas personagens irão cruzar-se, sendo que é nesse episódio que será dado destaque ao dia 25 de Abril.
As imagens falam por si
O 1.º episódio de “Daqui houve resistência” tem como protagonistas Nuno Nolasco (Rui Guimarães) e João Nunes Monteiro (Alberto Martins). O início do episódio é logo “direto”, pondo-nos dentro do contexto da Guerra Colonial e dos mortos que trouxe. “Não te culpes. (…) É a missão que nos deram.” diz o capitão a Rui Guimarães. Porque houve Guerra Colonial? É isso que nos traz logo a refletir os primeiros minutos do episódio. O Estado Novo defendeu até aos limites as suas colónias. E porquê?
É importante também falar do genérico inicial que, numa série como esta, ou seja, com diferentes narrativas em cada episódio está muito bem pensado. Neste genérico, com imagens de arquivo, reflete-se sobre a pobreza, sobre a força do Estado, sobre a Guerra Colonial, sobre as lutas possíveis…
Pouco depois, os nossos protagonistas cruzam-se. Rui regressa a casa e fala com Alberto, prestes a ir para a Universidade de Coimbra. Alberto: “Vais voltar para a Guerra?” Rui: “Sou militar. Não tenho escolha.” Alberto: “Temos sempre escolha.” Está assim dado o mote para a narrativa do episódio e o conflito entre as duas personagens.
A luta estudantil
Logo de seguida, passamos à Universidade de Coimbra, onde Alberto já é aluno. Numa sequência com menos de 10 minutos é assim dado destaque às lutas estudantis.
Portanto, uma mais valência em “Daqui houve resistência” que nos traz uma temática pouco abordada no cinema e na televisão. Certamente devido à duração do episódio e ao serem abordadas outras temáticas nos próximos episódios, sinto que se desperdiçou um pouco uma tão importante temática, o que é pena. Seria importante, a meu ver, que a situação da luta estudantil fosse em crescendo e não rebentasse logo em tão poucos minutos.
Sabemos que Alberto é antifascista na cena em que nos é apresentado, mas sentimos um vazio porque não vemos mais ações. Alberto é eleito Presidente da Associação de Estudantes, ouve um comentário de Marcello Caetano com os seus colegas, pede a palavra numa apresentação na Universidade e é logo castigado. É tudo tão rápido e não há um crescendo lento da situação…
O castigo militar
Como castigo, Alberto e os seus colegas não são presos mas sim mandados para o quartel para se “educarem”. E é aí que Alberto reencontra Rui. No meio de exercícios militares, ocorre um acidente. Os jovens militares encontram assim motivação para fazerem uma greve como resistência aos exercícios militares. Excelente forma de protesto! Não é com armas que se aprende, não é com armas que se acaba uma Guerra. É uma boa reflexão que ainda hoje é útil no meio de tantos conflitos a nível mundial…
Tudo tem significado em “Daqui houve resistência”
Mas Rui Guimarães também é humano. Não é uma personagem fechada. Perante a sua obrigação de militar, Rui também tem a consciência de que esta é uma Guerra absurda e sente um alívio de já lá não estar no campo de batalha. Tem mulher, tem um filho. A sua vida é dura e difícil. No fundo, Rui só gostaria de ter coragem para fazer a greve que Alberto e os seus colegas fazem. “Vocês conseguiram o que queriam. E eu de certa forma também. (…) Vocês vão embora.” Por detrás da rigidez, há humanidade. O sorriso que Rui e Alberto trocam na despedida é sintomático disso.
Por fim, uma última nota para a música original de Manuel de Oliveira. Em “Daqui houve resistência” a música não está só presente, tem um significado. A melancolia da morte na Guerra, a divergência de opinião, a repressão da polícia, a dor, a morte, a solidão. Tudo muito bem pontuado em cada cena com instrumentos de corda e de percussão.
Daqui houve resistência E1
Conclusão
- O primeiro episódio de “Daqui houve resistência” foi disponibilizado em antestreia na RTP Play pelas 12h. Com este 1.º episódio vemos que há um potencial elevado para o resto da narrativa mas que, com o caráter antológico da série, pode-se perder uma maior reflexão sobre as diferentes temáticas trazidas para análise.