Festival de Veneza | ‘Coup de Chance’: Woody Allen tem muita sorte na vida.
‘Coup de Chance’, o último filme de Woody Allen estreou em Veneza, (fora da competição). Trata-se de cerca de uma hora e meia de diversão numa espécie de história criminal sobre a lotaria da vida, a fazer lembrar ‘Martch Point’. O realizador foi recebido com protestos e na conferência de imprensa, entre duas reações: metade dos presentes aplaudiram de pé, enquanto outros ficaram sentados.
‘Coup de Chance’, de Woody Allen (fora da competição), estreou não sem a polémica prevista, que obviamente nada tem a ver com o filme, que é maravilhoso e uma pequena pérola de cinema. Mas antes criticando a presença do realizador no Festival — relacionada com a conhecida acusação pela filha Dylan, de abuso sexual em 1992. Woody Allen de 87 anos está aqui em Veneza, para ‘dar a cara’ por ‘Coup De Chance’, o seu 50º filme como realizador e o primeiro inteiramente falado em francês. O filme aborda o importante papel que a sorte desempenha nas nossas vidas e é interpretado por um elenco de estrelas francesas, incluindo Lou de Laâge, Valerie Lemercier, Melvil Poupaud e Niels Schneider, entre outros. ‘Coup De Chance’ segue Fanny (de Laage) e Jean (Poupaud), que parecem à primeira vista um casal modelo. Ambos talentosos e bem sucedidos profissionalmente, moram num lindo apartamento, num dos bairros mais exclusivos de Paris e parecem estar apaixonados como quando se conheceram. Porém eis quando Fanny, acidentalmente encontra na rua Alain (Schneider), um ex-colega da escola francesa de Nova Iorque. Os dois começa a ver-se com regularidade, ficam cada vez mais próximos e facilmente caem nos braços um do outro, até que o marido dela descobre. Daí para a frente é um jogo de sorte e azar, que culmina na fórmula clássica de crime e castigo, com a componente sorte pelo meio. O filme não tem grandes surpresas, mas é uma pura e inteligente diversão, com situações muito bem criadas e encadeadas e uns diálogos absolutamente notáveis e divertidos. É talvez o melhor filme de Woody Allen depois de ‘Meia Noite em Paris’ (2011).
‘Coup de Chance’ é no fundo um romance contemporâneo, uma comédia noir, sobre o amor, paixão, ciúme, infidelidade e crime. Na verdade, é uma história bastante vulgar, mas tem a particularidade de ter o ‘dedinho’ de um dos melhores cineastas do mundo, interpretações sensacionais — Allen sabe dirigir actores como ninguém, das grandes estrelas, aos menos conhecidos — e depois a mestria de Vittorio Storaro, que fotografa maravilhosamente, os lugares de Paris (os Jardins do Palais Royale ou o outono no Champs Elysees, por exemplo), que por si só é uma cidade muito fotogénica. O filme pode ser comparado a ‘Match Point’, mas faz lembrar também ‘Fim de Semana no Ascensor’ (1958), um film noir do realizador francês Louis Malle, até pela sua banda sonora e sobretudo por causa do tema do genérico final, o conhecido, ‘Cantaloupe Island’, no original de Nat Adderley.
VÊ TRAILER DE ‘COUP DE CHANCE’
Woody Allen encontrou-se com a imprensa internacional logo a seguir à projecção do filme e as reações não se fizeram esperar como já foi referido e ao mesmo tempo com um coletivo de cineastas franceses a colocarem cartazes em Veneza, criticando a sua presença no festival, além de Roman Polanski e Luc Besson, ambos como é sabido, acusados também de abuso sexual. Nas últimas 24h, os grupos de ativistas da indústria cinematográfica francesa Tapis Rouge e Colere Noire, colocaram faixas em locais de destaque, em Veneza, Paris e Deauville, com as mensagens: Estupradores em destaque, Festival sexista, resposta feminista ou O Leão de Ouro irá para um estuprador?.
Na conferência de imprensa não houveram perguntas diretas sobre os protestos ou sobre a polémica em torno de Allen. Em vez disso, Allen falou relacionando com o filme, o papel da sorte na sua própria vida. Allen disse: ‘Tive muita sorte durante toda a minha vida. Tive dois pais amorosos, tenho bons amigos, tenho uma vida e um casamento maravilhosos. Dois filhos. Daqui a alguns meses farei 88 anos, nunca estive num hospital e nada de terrível aconteceu comigo. Quando comecei a fazer filmes, as pessoas optaram por enfatizar o que eu era capaz de o fazer bem. E tive muita sorte com meu cinema, pois ao longo da minha vida recebi muitos elogios imerecidos e uma enorme atenção e respeito. Nada além de boa sorte, por isso, espero que dure’. Recorde-se que Woody Allen, estará daqui a dias em Portugal, para dois concertos com a sua banda e conversar com Ricardo Araújo Pereira.
JVM, em Veneza
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