LEFFEST’22 | Close, em análise
“Close”, melancólica segunda longa-metragem da autoria de Lukas Dhont, venceu o Grande Prémio no Festival de Cannes, entre inúmeros outros louvores. Em Portugal, tem primeira exibição assegurada na Seleção Oficial do LEFFEST ’22.
Aos 31 anos, o realizador belga Lukas Dhont afirma-se como uma importante promessa no circuito de cinema europeu. Assim o atesta o seu primeiro filme, “Girl” (2018), um drama íntimo e aclamado que venceu a Caméra D’or para Melhor Primeira Longa-Metragem no Festival de Cannes. Em 2022, regressa com “Close”, uma nova narrativa, também ela situada no universo dos dramas coming of age. Dilacerante, “Close” é um estudo valoroso acerca de amizade, luto e integração societária.
A 12 de novembro de 2022, pelas 21h30, “Close” exibiu, no Cinema Medeia Nimas, pela primeira vez em território nacional. “Close” revela-se como uma narrativa profundamente emotiva, sem puxar à lágrima ( pelo menos em demasia) ou sem entrar num campo do melodrama excessivo. Esta história, co-assinada pelo seu realizador, reflete acerca de amor fraterno, perda de inocência, bullying e também sobre as exigências societárias e de aceitação que se impõem no início da adolescência.
Com uma beleza e quietude impressionantes, patentes nos diálogos e também nos belos planos da natureza (o naturalismo abunda), a câmara de Lukas Dhont é vagarosa e gentil, colocando em destaque e fazendo brilhar os seus extraordinariamente competentes pequenos (grandes) protagonistas. Aqui apresenta-se a história de Léo (Eden Dambrine) e Remi (Gustav De Waele), dois rapazes de 13 anos muito próximos.
Sem malícia, a amizade de Leó e Remi é marcada pela inocência, por uma pureza própria da infância. Partilham um mundo que lhes é muito próprio, entre brincadeiras e uma intimidade bela e profunda, filmada através de close-ups e grandes planos. Os planos fechados remetem-nos para esta mesma intimidade, acentuando as micro expressões da dupla de protagonistas, à medida que estes nos conduzem através de uma idílica primeira parte de um filme. Aqui, a proximidade da câmara permite-nos ler dicas faciais, transmitindo calor e empatia. Mais tarde, esta mesma proximidade face ao sujeito irá intencionalmente, e com muita eficácia, traduzir-se em quase sufocante claustrofobia.
Tudo está bem e dificilmente conseguimos perceber qual será o conflito de “Close”. Isto, claro está, até Léo e Remi começarem um novo ano escolar, numa nova escola. Aqui, no pátio do recreio, afastamo-nos pela primeira vez para um plano aberto mais impessoal, onde a individualidade e calor são finalmente afastados e onde uma estranheza latente se instala. A amizade de Léo e Rémi será colocada em causa pela primeira vez, à medida que são alvos de comentários depreciativos por parte dos seus pares.
A sua bela e pura amizade é julgada, a homofobia mostra uma vez mais a sua corrosiva presença e permanência, mesmo numa Europa central do hoje e agora, e, com desconcertante naturalismo, observamos o quão destrutivas as pressões societárias podem ser. Léo, a personagem que carrega a obra às costas, tenta evitar estes comentários e afasta-se do seu amigo. As repercussões são inesperadas e emocionalmente cruéis.
“Close” depressa se torna um filme muito difícil de ver, uma reflexão acerca dos laços mais estreitos da amizade e como o título indica, uma visão acerca do que é a verdadeira proximidade, banhada com filtros de cores belos e algumas imagens capazes de assombrar, como a de uma porta aberta que simboliza uma ausência cruel e que consegue transmitir um mundo inteiro de significado através de um único frame sem diálogos.
É aliás este o poder da longa-metragem, transmitir significado através de marcas do quotidiano aparentemente banais e extrair os seus maiores picos de emotividade a partir das mais comuns interações humanas. Há uma notável beleza nos gestos, uma contemplação da natureza e ainda uma valorização das mais basilares relações familiares e humanas.
A aproximação posterior entre Léo e a mãe de Rémi, Sophie, reforça esta mesma capacidade de transmitir significado a partir da cumplicidade profunda atingida entre as figuras humanas que preenchem o ecrã. “Close”, em toda a sua tristeza profunda e inegável, quase incapacitante, não deixa de transpirar humanidade e calor.
Eden Dambrine e Gustav De Waele são estreantes enquanto Léo e Rémi, mas a direção de atores e a intensidade das suas performances torna tal facto quase imperceptível, perante o naturalismo já mencionado. Uma história em igual parte bela e trágica, “Close” é a escolha da Bélgica para candidato à categoria de Melhor Filme Internacional na próxima edição dos Óscares. Como tratado potente acerca de amizade, responsabilização e luto, não duvidamos do potencial inegável desta longa-metragem, certamente meritória de uma maior exposição e oportunidades de distribuição.
TRAILER | CLOSE TEVE ESTREIA NACIONAL NO LEFFEST ’22
Close, em análise
Movie title: Close
Movie description: Esta é a história de Léo e Rémi, dois rapazes de 13 anos, que são muito próximos, e que passam as férias de Verão juntos, numa intimidade inocente, própria da idade. No entanto, quando o ano lectivo começa, a amizade entre eles é colocada à prova, quando a sua relação é alvo de comentários depreciativos e preconceituosos por parte dos colegas. Numa tentativa de evitar essas observações intrusivas e negativas, Léo afasta-se de Rémi mas, quando este desaparece, Léo aproxima-se da mãe de Rémi, Sophie.
Date published: 13 de November de 2022
Country: Bélgica, Holanda, França
Duration: 105'
Director(s): Lukas Dhont
Actor(s): Edem Dambrine, Gustav De Waele, Émilie Dequenne
Genre: Drama
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Maggie Silva - 88
CONCLUSÃO
“Close” é uma bela narrativa acerca de perda, solidão e pura conexão humana. Do ponto de vista emotivo, o filme é verdadeiramente capaz de dilacerar a alma e estimular os sentidos. Eden Dambrine brilha particularmente como o jovem Léo, conseguindo carregar a pesada história às costas.
Pros
- As interpretações centrais dos dois jovens atores, bem como a presença das figuras que dão vida às suas mães, em particular uma assombrosa Émilie Dequenne como a mãe de Rémi;
- Um retrato de uma amizade bela, única, pura;
- O naturalismo patente, a valorização de prazeres simples como a companhia humana ou a quietude da natureza.
Cons
- O adeus a Rémi poderá parecer algo abrupto, e a sua ausência é capaz de engolir quem vê o filme (embora tal natureza abrupta seja importante para construir a própria reação dos restantes protagonistas). Quiçá fosse positivo saber algo mais acerca da sua presença? Quiçá pudesse não ter desaparecido tão cedo?