Love and Monsters, em análise
Um filme que acabou na Netflix, não seria talvez o mais expectável de chegar à corrida dos Óscares. Mas “Love and Monsters” chegou e vai estar lado a lado com “Tenet” ou “Midnight Sky”. Um misto de “Zombieland” com um filme de ficção científica repleto de grandes monstros, o filme conquista por algumas ideias mais ‘originais’.
Se pensarmos num cenário pós-apocalíptico o que nos vem à cabeça nunca passa muito dos mesmos temas: invasão alienígena, destruição massiva da Terra por armas nucleares ou guerras mundiais, um mega vírus que transforma todos os zombies ou, vá, alterações climáticas super extremas. Mas, e se o cenário for de mão humana mas com impacto na mãe natureza e esta se voltar contra nós?
Existem alguns spoilers nesta análise!
“Love and Monsters” não é um “Birdbox“, onde não se percebe bem o que aconteceu no mundo, mas também não é um “Um Lugar Silencioso“, que se destaca pelos animais predadores. Mas tem um pouco dos dois; é um cenário onde os humanos vivem isolados, e onde o menor barulho chama a atenção de quem não se quer, grandes animais, de anfíbios e insectos e até crustáceos. Mas com uma particularidade, todos eles mutantes. É na sua essência da mesma família do divertido “Zombieland” (mais do primeiro do que da sequela realmente).
O filme é nos apresentado quase como se de um livro se tratasse. Com um narrador, o protagonista Joel Dawson (Dylan O’Brien, “Maze Runner”), rapidamente ficamos a par dos eventos que antecederam este cenário “apocalíptico” e como é que ele chegou a um bunker debaixo do chão, e o porquê de andar em constante alerta para insectos gigantes. E aqui é sem dúvida um dos pontos fortes do filme – a introdução é realmente muito rápida a dar-nos os detalhes que queremos para compreender a história de fundo.
Com o desenrolar, acabamos por perceber que “Love and Monsters” é na sua essência uma comédia, em particular quando insiste em apresentar o protagonista da história como um jovem rapaz inapto, incapaz de se desenvencilhar sozinho e que cuja tarefa na sua colónia é meramente a cozinha. Não por ser muito bom, mas principalmente porque não tem capacidade para reagir perante situações de perigo, seja em prol da sua segurança ou dos outros. Ainda com a mente muito presa aos acontecimentos de há sete anos, Joel passa os dias à procura do seu amor de secundário, Aimee (Jessica Henwick) e a desenhar todos os monstros que a colónia já teve o infortúnio de encontrar.
E sim, é precisamente no meio da sua inaptidão, das suas capacidades artísticas, e na confiança cega de um jovem amor que Joel toma a decisão da sua vida: abandonar a colónia que lhe dá segurança e o mantém vivo, para encontrar Aimee, a namorada do secundário. Por entre chamadas rádio para a encontrar por todo o país, Joel parte rumo a ela, sabendo que é a ideia mais mirabolante de sempre, e munido de todas as armas que possa – ainda que não as saiba usar. E começa aqui a verdadeira história de “Love and Monsters”, assim como o motivo que leva o filme a ser destacado na categoria de nomeados ao Óscar de Melhores Efeitos Visuais.
Num mundo onde os vilões são monstros mutantes, afectados pela química de mísseis desenhados pelo homem, a equipa de efeitos visuais não poupou qualquer detalhe e fez questão que este ponto fosse flawless ao longo de todo o filme. Matt Sloan, Genevieve Camilleri, Matt Everitt e Brian Cox, os responsáveis do departamento, criaram criaturas únicas, com personalidades claramente distintas e donas de detalhes exímios, fosse pelo tamanho que lhes fora conferido, como pelas texturas presentes nos seus corpos ou pela vida que ganhavam através dos olhos.
Como ponto alto do filme, e não o fazemos pela nomeação aos prémios da Academia, reconhecemos que o mérito de “Love and Monsters” é o mundo monstruoso. Foram vários os insectos apresentados, mas a equipa destacou personagens como a centopeia Siren, a Rainha Sand Gobbler e um Hell Crab. Damos os parabéns porque o projecto teve a ousadia de apresentar este trabalho “à luz do dia”, onde todos os detalhes são visíveis e fáceis de notar, e onde o erro poderia estar mais visível. Mas não é o caso. Os pormenores são visíveis e a verdade é que são estes efeitos VFX que vendem a experiência da história do filme.
Por entre monstros e corridas pela sobrevivência, é de notar que as personagens secundárias no filme são escassas, ainda que relativamente interessantes. Durante a sua jornada, Joel encontra um cão, Boy, que será o seu novo companheiro de viagem; será verdadeiramente o braço direito de Joel e até determinante para a evolução das inaptidões de Joel e para o seu problema de “congelamento” face ao perigo. Mas ainda antes de chegar a Aimee encontra uma dupla improvável, Clyde (Michael Rooker) e Minnow (Ariana Greenblatt). Apesar de querermos que eles continuem ao lado de Joel pela jornada, a sua passagem no percurso até Aimee é decisivo para compreendermos ainda melhor este novo mundo da mãe natureza, e para o próprio crescimento de Joel.
Ao mesmo tempo, são eles que começam a levar o enredo para momentos de mais reflexão até sobre a natureza humana, e como é que a humanidade tem optado por sobreviver a este novo mundo. E se eles se vão embora a dada altura, o enredo coloca rapidamente outra personagem no radar de Joel, ainda que seja um robot, a Mav1s. Esta é talvez a interacção mas longa que Joel tem ao longo do filme e que nos permite ter um momento mais calmo, sem ataques de monstros, com pouca acção, mas que vem equilibrar na medida certa a narrativa do filme. Por última instância, a última personagem a ter mais tempo de ecrã é Aimee, o eterno amor de Joel, e talvez aí tenhamos tido a nossa desilusão. Queríamos acreditar que por entre peripécias e superação que Joel e Aimme teriam o seu final e apesar de ter ficado no ar, não gostámos de como foi feito. Sim, é normal que as pessoas cresçam, e que dadas as circunstâncias os sentimentos mudem, mas a história ate poderia ter sido um desgosto amoroso, e não um novo “arrebatar” porque o rapaz se tornou um herói momentaneamente.
Mas, à parte da história de amor, “Love and Monsters” destaca-se por não seguir o estereótipo do sobrevivente do apocalipse e pelo sentimento arrojado de se acreditar ser possível que os perigos de um apocalipse são tão visíveis e tenebrosos de se experienciar à luz do dia ao invés da noite. E se já houve a era dos dinossauros, se já pensámos em mundos engolidos pelos zombies… porque é que a ideia de super monstros derivados de animais radioactivos não poderia ser uma boa premissa? É tão boa como as outras, e aqui neste caso, excepcionalmente bem executada!
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Marta Kong Nunes - 75
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Cláudio Alves - 60
CONCLUSÃO
“Love & Monsters” destaca-se sem dúvida pelos monstros, e pelos seus detalhes, mas também prima por alguma originalidade na sua narrativa. Um protagonista que não é o típico herói, um toque de comédia bem equilibrado com os momentos de reflexão, e uma rápida explicação sobre o que aconteceu para causar o apocalipse (convenhamos, em muitos filmes é algo vago). É um óptimo filme de acção que se vê sempre bem, e que não nos parece que vá cansar. E teria sempre espaço para uma sequela divertida.
Overall
68User Review
( vote)Pros
. Os pormenores e detalhes de cada monstro (nomeação aos Óscares totalmente merecida!)
. O protagonista anti-herói e que foge à regra do “sabe tudo”
. O rápido encadeamento de acontecimentos e explicação
Cons
. A história de amor que no final não o é
. O típico final do “arrebatar a rapariga” com uma cena de acção (não era preciso e ficaríamos bem com isso)
. Ter ficado no “ar” a questão da nova colónia