© 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED. / © Featureflash Photo Agency via ShutterStock (ID: 2596816357) (Editado por Vitor Carvalho, © MHD)

Novocaine, a Crítica | Jack Quaid e Amber Midthunder brilham num filme ridículo e divertido

Novocaine, porque às vezes, para sentires alguma coisa no cinema, é preciso um protagonista que não sente nada.

Apresento-vos hoje uma obra que resume perfeitamente o que acontece quando Hollywood decide juntar um rapaz sensível que não sente dor, uma rapariga bonita em perigo e uma dose industrial de pancadaria: “Novocaine”. Este filme é como aquela comida que sabemos não ser boa para nós, mas que, por alguma razão inexplicável, saboreamos com um sorriso culpado nos lábios. Um triunfo da mediocridade bem executada, este “Novocaine” consegue ser simultaneamente previsível como um relógio suíço e surpreendentemente divertido como uma ida a um parque de diversões ligeiramente desatualizado.

Lê Também:
Martin Scorsese revela o motivo de existir um erro neste famoso filme com Robert De Niro

Novocaine não devia funcionar, mas funciona

Jack Quaid
© 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED.

Vamos ser honestos: a premissa é tão básica quanto uma miúda que só bebe Starbucks e usa UGGs no inverno. O nosso protagonista Nate, interpretado pelo talentoso Jack Quaid (sim, filho do Dennis Quaid), sofre de uma condição genética rara chamada CIPA – em bom português, o rapaz não consegue sentir dor. Uma condição que seria trágica na vida real transforma-se aqui numa espécie de superpoder questionável: imaginem ter de programar alarmes de três em três horas para ir à casa de banho para que a vossa bexiga não expluda! E ainda assim, quando a sua paixão Sherry (Amber Midthunder) é raptada durante um assalto a um banco, o nosso herói improvável transforma-se num Deadpool da secção de descontos, embarcando numa odisseia de vingança que o deixaria incapacitado na vida real.

Curiosamente, os realizadores Dan Berk e Robert Olsen conseguem equilibrar esta corda bamba de absurdo com uma destreza que me deixou genuinamente surpreendido. A premissa é simultaneamente ridícula e cativante: um homem que não pode comer alimentos sólidos porque podia, literalmente, morder a própria língua, mas pode levar com balas, pauladas e queimaduras sem pestanejar. É como se alguém tivesse perguntado: “E se o John McClane de ‘Die Hard‘ fosse um contabilista introvertido?”

Um romance que mata (literalmente)

Amber Midthunder em Novocaine
© 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED.

Se há coisa que este filme consegue é fazer-nos questionar a natureza do amor. Será que o amor verdadeiro é perseguir criminosos armados pela cidade depois de uma única noite de paixão? Segundo “Novocaine”, aparentemente sim! Apesar da dedicação quase patética de Nate à sua amada Sherry, a química entre Quaid e Midthunder cai no território da telenovela. Enquanto a intenção do filme é pintar Nate como um tolo apaixonado (o núcleo cómico) e subvertê-lo com a sua fúria desenfreada (o eixo da ação), o romance entre os protagonistas — a força por detrás de todo o banho de sangue — nunca se torna verdadeiramente convincente.

O guião de Lars Jacobson tenta desesperadamente convencer-nos que estas duas personagens partilham um vínculo profundo baseado em… bem, não tenho bem a certeza. Talvez seja o facto de Sherry ser a única pessoa que parece ver além da condição de Nate? Ou talvez seja apenas porque ela é bonita e ele está desesperadamente só? De qualquer forma, a execução é tão subtil como um murro na cara – apropriado, considerando a temática do filme.

A comédia física levada ao extremo

Jack Quaid em Novocaine 2-min
© 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED.

Onde “Novocaine” realmente brilha é na sua capacidade de nos fazer alternar entre o riso e a contração involuntária dos músculos. Os realizadores, com as suas raízes no cinema de terror, trazem uma energia visual palpável que eleva o material além da sua natureza estereotípica. As sequências de ação são coreografadas com um entusiasmo genuíno pelo espetáculo da violência, raramente desviando o olhar dos momentos que nos fazem encolher instintivamente. O desempenho de Quaid é magistral na sua capacidade de combinar um olhar vazio de quem acabou de ver algo terrível com a determinação cómica de um homem apaixonado que simplesmente não sabe quando parar. Há uma cena em particular que envolve uma frigideira quente que me fez simultaneamente rir e agarrar a minha própria mão em solidariedade fantasma.

Num filme desta natureza, seria simples atirar tripas à parede e ver o que cola, mas há um artesanato intencional em exibição. Os realizadores não poupam nas sequências de ação, oferecendo-nos um buffet de lesões corporais tão criativas que quase merecem um prémio da academia de efeitos especiais. É refrescante ver um herói de ação que, em vez de sair ileso de cada confronto, parece mais um boneco de teste de colisão à medida que o filme avança. Traumas que quebram ossos e queimam pele são utilizados não apenas para humor e ação, mas também como estrutura narrativa. Referências inteligentes a ferimentos anteriores mantêm o ritmo cinético do filme sem que os detalhes pareçam supérfluos.

Subtileza? Não conheço essa palavra

Betty Gabriel em Novocaine
Betty Gabriel em Novocaine © 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED.

Se procuram nuance e profundidade filosófica, sugiro que procurem noutro lugar – talvez num documentário sobre caracóis ou num filme francês a preto e branco. “Novocaine” sabe exatamente o que é: um filme de ação-comédia que não pede desculpa pela sua própria existência. É como se os anos 2010 tivessem sido metidos numa cápsula do tempo e libertados nos nossos cinemas em 2025. É básico? Absolutamente. É previsível? Sem dúvida. Mas executa a sua premissa de ser uma exploração divertida, rápida e esquecível da dor com tanta competência e não tenta fazer mais do que isso. E há algo de respeitável nessa autoconsciência. Tal como o medicamento que lhe dá o nome, “Novocaine” não cura nada permanentemente, mas oferece um alívio temporário da dor de viver num mundo onde o cinema de ação-comédia original é cada vez mais raro.

O filme chega a abordar questões sobre a natureza da dor e como ela nos define enquanto seres humanos, mas fá-lo com a subtileza de um elefante numa loja de porcelanas. Há um momento em que Nate reflete sobre como nunca saberá o que é sentir dor física, enquanto simultaneamente compreende a dor emocional de perder Sherry. É quase poético… quase.

Mediocridade executada com excelência

Jack Quaid em Novocaine 3
© 2024 PARAMOUNT PICTURES. ALL RIGHTS RESERVED.

No final das contas, “Novocaine” é um filme que abraça as suas limitações e dança alegremente com elas até ao pôr-do-sol. Não vai ganhar Óscares (a não ser que exista uma categoria para “Uso Mais Criativo de Objetos Domésticos Como Armas”), mas também não pretende. É como aquele amigo que sabe que não é o mais inteligente da sala, mas compensa com personalidade e entusiasmo.

Jack Quaid carrega o filme nos ombros como um Atlas moderno, dando-nos um protagonista que, apesar de todas as suas falhas, não conseguimos deixar de apoiar. A sua transformação de funcionário bancário tímido para vingador destemido é tão ridícula quanto satisfatória. Ray Nicholson, como o vilão, mastiga o cenário com um deleite contagioso que nos faz desejar que tivesse mais tempo de ecrã.

“Novocaine” é o equivalente cinematográfico de uma refeição no McDonald’s: sabes que não é alta gastronomia, provavelmente não é bom para ti, mas de vez em quando, sabe bem. É um filme que não pede para ser analisado, apenas para ser apreciado pelo espetáculo de extremidades corporais dobradas em ângulos não naturais e pela promessa implícita de que, por mais pancada que leves na vida, o amor (ou algo vagamente parecido) conquista tudo.

 Nota final: 6/10 garfos na perna do Nate

Se procuram um filme para desligar o cérebro durante 90 e poucos minutos, acompanhado de uma bebida fresca e amigos pouco exigentes, “Novocaine” é a vossa escolha.

Trailer | Novocaine

Já viram um filme tão ridículo que vos deixou com vergonha de admitir que gostaram? Partilhem nos comentários a vossa dose preferida de “guilty pleasure” cinematográfico!

Novocaine, a Crítica
Novocaine - Poster (2)

Movie title: Novocaine

Movie description: "Novocaine" é uma comédia de ação que segue Nathan Caine (Jack Quaid), um homem com insensibilidade congénita à dor, que transforma a sua condição numa vantagem inesperada ao tentar resgatar Sherry (Amber Midthunder), a mulher por quem se apaixonou, após ela ser sequestrada durante um assalto ao banco onde trabalham.

Date published: 13 de March de 2025

Country: Estados Unidos da América

Duration: 110'

Director(s): Dan Berk, Robert Olsen

Actor(s): Jack Quaid, Amber Midthunder, Ray Nicholson

Genre: Thriller, Comédia, Ação

[ More ]

  • Vítor Carvalho - 60
60

Conclusão

“Novocaine” é como aquele hambúrguer gorduroso que sabes que não te faz bem, mas que devoras com um sorriso de culpa e satisfação. É previsível, absurdo e, por vezes, tão subtil como um tijolo na cara, mas há uma certa magia na forma como abraça a sua própria loucura. Jack Quaid entrega uma performance que oscila entre o patético e o heroico, enquanto o filme desfila uma série de cenas de ação tão criativas quanto dolorosas (para nós, não para ele). No final, “Novocaine” não é uma obra-prima, mas é uma diversão descartável que cumpre o prometido: uma montanha-russa de pancadaria, romance duvidoso e humor negro. Nota final: 6/10 garfos na perna do Nate — porque, às vezes, é bom rir da dor dos outros (especialmente quando eles não a sentem).

Pros

  • A ideia de um protagonista que não sente dor física, transformando isso num “superpoder” questionável, é cativante e diferente.
  • As cenas de ação são divertidas e cheias de energia, com ferimentos e situações que alternam entre o cómico e o doloroso.
  •  O ator carrega o filme nos ombros, entregando um desempenho equilibrado entre o cómico e o dramático, tornando Nate um protagonista improvável, mas simpático.
  • O filme não tem medo de ser excessivo, oferecendo momentos que fazem rir e encolher ao mesmo tempo.
  • O filme sabe que é básico e previsível, mas abraça essa identidade sem tentar ser mais do que é.
  • Com 110 minutos, é um filme rápido e divertido, ideal para desligar o cérebro.
  • O uso criativo de objetos domésticos como armas adiciona um toque de originalidade às cenas de ação.

Cons

  • A química entre Nate e Sherry é fraca, e o vínculo emocional que supostamente os une nunca parece genuíno.
  • O filme aborda temas como a dor e o amor de forma tão óbvia que chega a ser caricato.
  • A rapariga em perigo e o vilão exagerado são arquétipos já vistos mil vezes.
  • A condição de Nate (CIPA) podia ter sido usada de forma mais profunda, mas acaba por ser apenas um pretexto para cenas de ação.
  • A história segue um caminho bastante óbvio, sem grandes surpresas ou reviravoltas.
  • Algumas piadas e situações podem cair no ridículo sem conseguir provocar risos.
  •  Apesar de tentar abordar temas como a dor e a perda, o filme não consegue desenvolver essas ideias de forma significativa.
Sending
User Review
0 (0 votes)


Loading poll ...
Em breve
A Tua Opinião Conta: Qual é a melhor?

Também do teu Interesse:



About The Author


Leave a Reply