Podia Ter Esperado Por Agosto, a crítica | César Mourão e a comédia romântica do verão
“Podia Ter Esperado Por Agosto”, marca a estreia do comediante, actor e apresentador César Mourão como realizador de cinema. Nesta engraçada comédia romântica, além de assinar o argumento, Mourão assume o papel principal ao lado da bela atriz Júlia Palha, do luso-francês Kevin Dias (‘Emily In Paris’) e de um leque de grandes e conhecidos atores portugueses. O filme chega aos cinemas na próxima quinta 18 de julho.
“Podia Ter Esperado por Agosto”, o filme escrito, realizado e protagonizado por César Mourão é uma divertida comédia romântica que promete envolver o público numa narrativa perspicaz, com personagens-tipo muito bem desenvolvidas e bastante caricatas, com as quais nos identificamos facilmente.
Trata-se de mais um obra produzida pela 313, a empresa co-fundada por César Mourão (juntamente com Diogo Brito), de onde já saíram séries de êxito nacional como “Santiago” (2022) e “Futre – O Primeiro Português”, (2022), ambas disponíveis no streaming da OPTO SIC.
Porém, esta longa-metragem de quase duas horas, “Podia Ter Esperado Por Agosto”, é agora ambientada na magnifica e pitoresca aldeia do Soajo, na Peneda-Gerês, uma localidade famosa pela beleza das suas ruas e casas típicas em granito e principalmente pelos seus ‘espigueiros’, edificações únicas e tradicionais da região, e um povoado que não podia ser mais romântico e idílico.
Este filme bastante engraçado, que conta também com uma certa dose de humor negro e loucura, consegue captar com bastante detalhe o contraste e a essência dos meios pequenos, das aldeias e das comunidades rurais portuguesas, do chamado Portugal profundo, em comparação com o ritmo frenético da cidade, dois mundos de alguma forma antagónicos, mas que permanecem ligados pela migração.
Uma comédia romântica moderna
Recorde-se que passou também quase uma década da estreia de “A Canção de Lisboa”, (2016) de Pedro Varela, onde César Mourão vestiu a pele de Vasco Santana, mas ainda bem que isso não lhe serviu de referência. Por isso, “Podia Ter Esperado por Agosto”, não é felizmente mais uma tentativa falhada de revistar as velhas comédias portuguesas dos anos 40 e 50 e isso é logo um bom princípio..
Aliás, este filme destaca-se antes pela sua abordagem simples, despretensiosa e sobretudo pela capacidade única do gentil e brincalhão César Mourão transformar situações quotidianas em alguns momentos de reflexão, trazendo ao mesmo tempo para a tela personagens carismáticas, mas sempre com bastante humor e muita sensibilidade, como aliás o faz na realidade, no seu divertido programa “Terra Nossa”, exibido na SIC.
O sacristão malandro do Julião
“Podia Ter Esperado por Agosto”, é um filme produzido precisamente com o apoio da SIC e da sua plataforma OPTO — e sem financiamentos públicos — centra-se na história de Xavier (César Mourão), um curioso rapaz da aldeia, sacristão nas horas vagas, romântico, tímido e ingénuo nas coisas do amor, que se apaixona perdidamente por Laura (Júlia Palha), uma ‘betinha’ da cidade, neta de um solitário vizinho, mas que todos os verões vem passar parte das suas férias a casa do avô. Apesar de alguns flirts inconsequentes nos ‘bailaricos’ de Verão, Xavier parece conformado de que não tem nenhuma hipótese de conquistar a bela Laura de Lisboa.
Mas, as confidências com o seu melhor amigo e parceiro de sacristia, Julião (Kevin Dias), um verdadeiro cérebro das mais variadas e loucas maquinações, acabam por desencadear uma sequência vertiginosa de acontecimentos inesperados, que o vão pelo menos tentar aproximar Xavier da sua amada lisboeta. Conseguirá o desesperado Xavier, com a ajuda do imaginativo e inconsequente Julião e de outros aliados, reconquistar o amor da sua vida e evitar que o resto da aldeia lhes caia em cima? Porém, até quando o amor pode esperar por esse querido mês de Agosto?
Uma história rocambolesca
César Mourão convida-nos assim em “Podia Ter Esperado por Agosto”, a mergulhar numa comédia romântica rocambolesca, que explora os temas do dia-a-dia do lugarejo, na paisagem bucólica e efervescente da pequena aldeia do norte rural em Portugal, encravada entre pedras e a montanha do Gerês, com os ‘espigueiros’ em fundo. O filme “fala-nos da importância de sabermos rejeitar a primeira ideia, que é uma coisa que me persegue nos meus 24 anos de teatro de improvisação. A primeira ideia é sempre uma ideia fácil e pouco surpreendente’’, dizia o realizador.
E por isso, “Podia Ter Esperado por Agosto” traz-nos uma narrativa peculiar, repleta de esquemas e reviravoltas que espelham, com muito humor e muita ironia, uma realidade bastante comum às várias aldeias portuguesas, como por exemplo também no filme “Aquele Querido Mês de Agosto”, de Miguel Gomes; embora este num registo diferente e obviamente mais sofisticado. Recorde-se que de Agosto é tradicionalmente o mês em que os imigrantes quer do estrangeiro, quer da cidade, regressam às suas origens e às suas tradições festivas, proporcionando também muitas histórias de amor e casamentos improváveis.
Personagens bastante familiares
César Mourão, que não só realiza mas também interpreta o conformado Xavier, entrega-se obviamente a uma excelente interpretação, quase fazendo e bem de ele mesmo ou pelo menos tornando-se para nós bastante familiar da televisão. A sua habilidade em equilibrar momentos cómicos com a improvisação é notável, conferindo ao seu personagem uma autenticidade que ressoa com o público, como aliás acontece igualmente no seu programa “Terra Nossa”.
No elenco de apoio ou melhor, os outros dois protagonistas de “Podia Ter Esperado por Agosto”, são interpretados por Júlia Palha (“Ordem Moral”) e Kevin Dias (da série francesa ‘Emily in Paris’), dois talentos, que complementam muito bem a performance de Mourão, oferecendo-nos igualmente duas interpretações robustas e cativantes; sobretudo a interpretação do luso-francês, que além dos seus incríveis esquemas, como personagem um jovem imigrante regressado às origens, acrescenta-lhe o seu peculiar sotaque e o charme de algumas expressões em francês.
Referências da commedia dell’arte
O argumento, escrito pelo próprio Mourão — em parceria com o argumentista Pedro Goulão — é também um dos méritos do filme, parecendo mesmo dar alguma liberdade para a improvisação típica da commedia dell’arte, de que o actor é um grande conhecedor e especialista. A escrita de “Podia Ter Esperado por Agosto”, é inteligente e subtil, não é desbragada, com diálogos naturais que capturam a essência das relações humanas sobretudo das personagens-tipo desta aldeia, igual a muitas outras de Portugal: o cangalheiro de Dinarte Branco é absolutamente notável, assim como a ironia do típico padre de aldeia, de batina até aos pés, interpretado por António Fonseca; a ‘codrilheira’ e dona do café magnificamente recriada por uma soberba Carla Vasconcelos; e depois a figura-chave do enredo, que começa o filme e desmonta toda a tramóia, o bêbado deliciosamente interpretado pelo sempre expressivo Pedro Lacerda.
Para além destes comediantes, o filme integra alguns dos melhores e mais conhecidos actores portugueses: Manuel Cavaco, Luísa Cruz, João Reis, Vera Moura, e Marco Paiva, que completam o elenco notável, desta comédia inteligente rodada entre Lisboa e o norte de Portugal, onde se sente que a equipa trabalhou com gosto e divertiu-se.
Uma estreia atrás das câmaras
A realização de “Podia Ter Esperado por Agosto”, é igualmente competente, com Mourão pela primeira vez atrás das câmaras, ao nível da longa-metragem, a demonstrar um domínio razoavelmente seguro sobre a narrativa romântica, permitindo que a história se desenrole de forma rítmica, orgânica e envolvente para o espectador. Quanto à direcção de fotografia, a cargo de William Sossai, é outro elemento a destacar, sobretudo pela forma como filma o verde das paisagens e da aldeia cor de granito do Norte de Portugal. As escolhas visuais — embora por vezes abuse um bocadinho dos planos e longas sequências de drone — contribuem de facto para criar a atmosfera romântica e ao mesmo tempo campestre do filme.
Utilizando aliás, uma paleta de cores suaves e enquadramentos cuidadosos, que transmitem as nuances emocionais e divertidas da rocambolesca narrativa, que quase roça o fantástico, cheia de reviravoltas e pequenos enganos. Apenas uma pequena sugestão em relação ao título: acho que preferia que fosse mais directo isto é “Podias Ter Esperado Por Agosto”, soava melhor e já que é uma fala de Laura (Palha), para Xavier (Mourão), num dos momentos cruciais do filme.
Vais ver o primeiro filme realizado por César Mourão?
Podia Ter Esperado Por Agosto, a crítica
Movie title: Podia Ter Esperado Por Agosto
Movie description: Em “Podia Ter Esperado Por Agosto”, de César Mourão, numa aldeia remota do interior do país, um homem apaixonado (César Mourão) e o seu melhor amigo (Kevin Dias) engendram um plano, sem pés nem cabeça, para atrair de Lisboa a mulher amada (Júlia Palha) do primeiro. Contra todas as expectativas, o plano resulta e aí começam os verdadeiros problemas, originando uma comédia romântica rocambolesca onde dois mundos, da cidade e da aldeia se chocam, mas na verdade com um final feliz.
Date published: 16 de July de 2024
Country: Portugal, 2024
Duration: 115 minutos
Author: José Vieira Mendes
Director(s): César Mourão
Actor(s): César Mourão, Júlia Palha, Kevin Dias
Genre: Comédia romântica
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José Vieira Mendes - 60
Conclusão:
Em suma, “Podia Ter Esperado por Agosto” é uma comédia romântica deliciosamente divertida, que destaca César Mourão como um dos talentos mais versáteis do audiovisual português contemporâneo, que vai da escrita até agora a esta sua estreia como realizador de cinema. A sua habilidade em conjugar humor e uma certa sensibilidade e autenticidade, como aliás o faz no seu “Terra Nossa”, aliado a um talentoso e notável elenco e uma produção de qualidade, fazem deste filme despretensioso, uma experiência bastante agradável e sã para a mente. Recomendado para todos os espectadores de todas as idades, sobretudo aqueles (as) que querem passar uns bons momentos de diversão, apreciam comédias românticas simples, mas bem elaboradas. Este filme, não sendo uma obra-prima de excelência, deixará pelo menos uma marca positiva e de alegria nos espectadores. Depois não venham dizer que já não se fazem comédias em Portugal.
Pros
César Mourão está pela primeira vez atrás das câmaras e demonstra um domínio razoavelmente seguro sobre esta narrativa romântica e divertida, mostrando a sua enorme versatilidade e talento em várias áreas.
Cons
É uma história simples, pouco sofisticada, inteligente sim, mas talvez demasiado ligeira para certo tipo de espectadores. A realização e a direcção de fotografia abusam um bocadinho dos longos planos e das sequências filmadas pelo drone. Está na moda!